terça-feira, 19 de março de 2013

Alunos EJA: retomando os estudos e escrevendo um novo futuro

A história de sucesso de um casal da terceira idade que foi aluno EJA e chegou à faculdade; um exemplo de vida a se seguido por muitos jovens que buscam dar continuidade aos estudos.

 Texto e Fotos: Janaína Farias 
Maria Ferreira dos Santos, 62 anos
e Maurício Ferreira dos Santos, 66 anos, ex- alunos de EJA, com sua bisneta, Eduarda Roberta Ferreira, também aluna da escola.
O que parecia impossível para um casal de mais de 60 anos de idade se tornou realidade. O sonho de entrar numa faculdade não só resgatou sua autoestima como renovou todos seus objetivos, temporariamente adormecido, ou melhor, adiado. O futuro então bateu na porta e o sonho estava começando a se realizar: Maria Ferreira dos Santos de 62 anos e Maurício Ferreira dos Santos de 66 anos, ex- alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola Municipal Nise da Silveira, situada no Conjunto Antares, - depois de passar por várias dificuldades e desafios, e enfrentar inúmeras barreiras, pais de 3 filhos, 7 netos e 2 bisnetos, hoje universitários- frequentadores do curso Agente Social, da Faculdade da Cidade de Maceió (Facima)-conseguiram superar as dificuldades sociais como o trabalho e a falta de condições financeira que levam milhares de jovens a abandonar os estudos no tempo regular todos os anos.

Do analfabetismo a um curso superior

 A força de vontade do casal extrapolou a sala de aula- aprender a ler e escrever, o que já estavam acima da expectativa - quiçá conseguir cursar um curso superior, refazer os planos, ter uma profissão, conseguir um trabalho. Entretanto nada foi fácil, por muitas vezes pensaram até em desistir. Mesmo sem condições de assistirem as aulas por conta de uma roupa ou até mesmo de um calçado não abalou o desejo de continuar. “Pensei parar na 4ª série, não tínhamos condições de ir à escola e ainda tínhamos que enfrentar outra situação, pois a escola que estudávamos não dava continuidade a EJA, mas me veio uma força interior e o apoio dos amigos, e da direção, então continuei”, justifica Maria Ferreira.

Como na época, a escola Nise da Silveira não oferecia a II fase da EJA o casal tive que procurar outra escola, onde pudesse continuar o fundamental. Com isso bateu a insegurança de ter que começar tudo de novo, como conta Maurício Ferreira. “Sentia medo de chegar à outra escola e principalmente de não se adaptar com a turma. Até por que fomos parar numa turma de jovens e a adaptação era imprescindível para continuar os estudos”.

O exemplo

A conclusão do ensino fundamental foi em outra escola. Com essa mudança o senhor Maurício Ferreira e a dona de casa Maria Ferreira por uma surpresa do destino passou a frequentar a mesma sala de aula que seus netos, quando se deparou com a desmotivação e a falta de estímulo mais uma vez, “era uma fase muito difícil, com muita dificuldade. Pensávamos em parar, assim como meus netos, mas não podíamos demonstrar fraqueza e nem tampouco desistir dos nossos objetivos”, frisa Maurício. 

Seguros do que queriam e aonde chegar, incentivaram seus netos a não parar, anos se passaram e juntos com eles concluíram o fundamental e o médio. “Se eu tivesse desistido tinha me arrependido. Pelo que sei hoje e pelo conhecimento que tenho não penso em parar nunca mais. Sinto-me muito feliz, não tem coisa melhor do que está numa sala de aula. Fomos exemplos também para nossos netos” desabafa o universitário.

Desenhando um novo futuro

Com várias lições e uma vasta experiência de vida o estudante do curso de agente social, recomenda as pessoas que pararam por um motivo ou outro, procurar retornar os estudos, considerando ele o que há de melhor na vida para crescer. Com planos de trabalhar na área e ser um profissional aos 66 anos de idade, Maurício Ferreira quer mais. Como educador pensa em ajudar ao próximo e levar conhecimento para as pessoas. Para ele, o estudo da EJA, abre os olhos dos alunos e o incentiva a enxergar cada vez mais longe. 

Mesmo sendo o único homem da turma da faculdade, Maurício Ferreira não vê problema, não fica tímido nem muito menos envergonhado, segundo ele, isso não impede diante de tudo que já passou, de realizar seu grande sonho que é ter um diploma de um curso superior.

Estudante trabalhador

Segundo dados do censo 2012 existe em Maceió cerca de 165.992 analfabetos acima de 15 anos. O aluno EJA é um estudante trabalhador que precisar de uma atividade remunerada para compor a receita mensal da família, sendo esse um dos motivos que muitos alunos abandonam o ensino fundamental antes de concluí-lo. Foi o que aconteceu com a estudante Nazilde Paulino da Silva que só voltou a estudar esse ano, com 50 anos de idade. Nazilde não quer ser mais uma a engrossar as estatísticas dos números de analfabetos na capital. Ela quer ser servidora pública e sabe que para isso será preciso muita dedicação aos estudos. “Quero ter um futuro melhor” afirma ela. 

Como Nazilda morava no interior e a distância entre a escola e sua casa a impedia de frequentar uma sala de aula, o tempo foi passando e a idade aumentando aos 13 anos começou a trabalhar como empregada doméstica atividade que ocupa até hoje. Com os filhos criados e um empurrão da patroa Nazilde finalmente retornou aos estudos. Ela atualmente está no 2º ano do 1º seguimento e a tendência é avançar. Nazilde conta que seus três filhos concluíram os estudos e por conta dessa evolução eles também passaram a cobrar mais dela. “diferente deles precisei trabalhar, voltei a estudar pela minha independência. Me incomodava muito quando eu queria pegar um ônibus e tinha que contar com a ajuda das pessoas. Não queria incomodar ninguém. Hoje posso dizer que estou conseguindo resgatar minha cidadania”, destaca.

Relatos do estudante de EJA: desmotivação, distância da escola, evasão e trabalho


Quase sempre entre os motivos que levam o estudante a abonadona o estudo ainda jovem tem um fator social como carro-chefe da história. Ademário da Silva de 47 anos é um desses exemplos. Devido a distância de sua casa da escola só começou a estudar aos 9 anos. Entre idas e vindas não conseguiu prosseguir nos estudos, entrava na escola e logo saía. Foi assim durante muito tempo, desmotivado não se identificava com alguns projetos do governo brasileiro na época como o Movimento Brasileiro de Alfabetização- o conhecido Mobral. O tempo foi passando e o trabalho foi priorizado. Há mais de 20 anos sem estudar Ademário finalmente procurou a EJA e fixou um objetivo “Quero crescer e melhorar minha situação financeira”, assegura ele. Quando mais novo queria se formar em medicina, agora com outros projetos de vida quer ser empresário. Com muitos sonhos a realizar, o retorno aos estudos lhe permite projetar um futuro melhor “quero trabalhar pra mim mesmo, fazer cursos, chegar ao máximo”, afirma o estudante.


A escola contribuindo na valorização da autoestima dos jovens e adultos

Arlete Domingues, diretora da escola Nise da Silveira, explica que o aluno EJA é um estudante que já tem conhecimento adquiridos e experiência de vida. Ela informa que muitas pessoas procuram a EJA como uma forma de se alfabetizar, já que no passado por um motivo ou outro não teve a oportunidade de estudar ou tiveram que abandonar a escola. E uma das formas de garantir a motivação e a permanência deles, segundo Arlete, é avaliação que é feita todo início de ano. De acordo com a diretora essa metodologia abordada beneficia o aluno em pular etapas, dependendo do nível em que se encontram. 

Para ela é um prazer enorme enquanto educador presenciar o sucesso do aluno adulto. “os professores da EJA trabalham a valorização da autoestima dos alunos e quando conseguimos deixar ele capaz, isso é muito satisfatório, ficamos altamente compensados. É um troféu quando vemos um sucesso desses como o da Maria Ferreira e Maurício Ferreira. Saber que a gente foi fundamental para a permanência e a continuidade deles na escola, não tem explicação, é muito forte”, comenta Arlete bastante emocionada. 

Arlete salienta que a coordenadora de EJA, Auta Apratto, tem sido fundamental na Educação de Jovens e Adultos nessa escola. “Alta tem feito um trabalho importante e significativo na contribuição da alfabetização dos jovens e adultos. Nessa fase da vida eles precisam ser incentivados e motivados e isso tem sido primordial para a permanência deles na sala de aula”, assegura.


A Coordenadora e professora, Auta Apratto, relata sua rica experiência com os alunos de EJA  "Trabalhar com alunos de EJA possibilita ao educador uma rica experiência de vida e cita exemplos como motivação, elevação da autoestima, busca de aprendizagem significativa voltada para o exercício da cidadania”, frisa.  Segundo ela torna-se imprescindível o desenvolvimento de aulas e atividades que despertem o interesse real dos alunos uma vez  que já possuem experiências de vida e precisam ocupar um lugar ou manter-se ativo.

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