Boletim Semed: Alfabetização melhora vida de alunos da Ejai em Maceió

Educação transforma vida de oito mil alunos da Educação para Jovens, Adultos e Idosos (Ejai) de Maceió que agora sabem ler e escrever

Por Thiago Aquino

Parceria com a ONU contribui para a redução do analfabetismo
na capital alagoana (Foto: Pei Fon/ Secom Maceió)

“Quem não sabe ler é um cego: agora é que estou me tornando outra pessoa, porque estou sentindo o sabor da leitura”. A declaração é de quem é exemplo da transformação de vida por meio da educação. Antônio Francisco Santos, de 48 anos, é um dos oito mil alunos inseridos na Educação para Jovens, Adultos e Idosos (Ejai) de Maceió, que deixou o grupo de pessoas que não sabe ler e escrever.

Os investimentos da Prefeitura de Maceió nas 52 escolas que oferecem a Ejai e as ações, desde 2013, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) da Organização das Nações Unidas (ONU), estão impulsionando a redução da taxa de analfabetismo na capital alagoana. Uma pesquisa divulgada em 2016 pelo International Policy Center for Inclusive Growth (IPC-IG) já apontava a redução de 3,1 do índice de pessoas enquadradas neste perfil.

O pedreiro Antônio Francisco não tem ideia do quanto a sua presença na sala de aula representa para esta estatística, mas ele tem a certeza de que a rotina ao lado do caderno e do lápis vem fazendo a diferença. As mãos calejadas que hoje escrevem timidamente realizam traços em uma nova página da vida, colocando de lado as dificuldades do passado e trazem uma melhor perspectiva de vida.

“Quando estou em alguns lugares já começo a ler as coisas e, quando não consigo ler tudo, pelo menos já sei do que se trata e dá pra entender. Agora estou começando a ser outra pessoa, porque nunca tive a chance de estudar: meus pais eram doentes, dependiam de mim e depois fiquei vivendo por conta própria sem receber nenhuma cobrança de estudo. Mesmo sob a luz do dia, não enxergava porque era ‘dirigido’ pelas mãos dos outros”, contou Antônio.

A motivação que o leva para a Escola Natalina Costa Cavalcante, no Conjunto Cleto Marques, no bairro do Tabuleiro do Martins, nem sempre ganha apoio das pessoas mais próximas. Questionado por elas sobre “o que um velho vai fazer na escola”, Antônio sempre tem uma resposta na ponta da língua: “A esperança morre junto com cada pessoa e ninguém vive com a do outro, mas sim com a sabedoria que se adquire no dia a dia”.

Confira abaixo a experiência dos alunos Ejai em sala de aula:

Foi na oferta de aulas noturnas de segunda a sexta-feira que David Marlisson, de 20 anos, também viu uma oportunidade de começar a estudar, um sonho que foi interrompido há mais de sete anos quando, ainda na adolescência, precisou trabalhar em uma oficina mecânica para ajudar a manter a família.

Hoje, David está na 3ª fase da primeira etapa da Ejai e, apesar de trabalhar durante o dia, o desejo é de continuar compreendendo o mundo da leitura. “Tomei uma decisão de voltar a estudar para ter um futuro melhor e estou feliz em estar aqui estudando, além de conhecer pessoas novas. Quero terminar meus estudos e me formar, porque sem eles não sou nada”, colocou.

Na Escola Natalina Costa Cavalcante, são 90 alunos divididos em três turmas da 1ª, 2ª e 3ª fase do primeiro seguimento da Ejai, que são os anos iniciais do ensino fundamental. É o primeiro ano que há a movimentação à noite no ambiente escolar. “Após pedidos de pais e avós de alunos que estudam durante o dia, conseguimos com a Semed a implantação da Ejai, uma alegria para os moradores da região”, afirmou a diretora da unidade, Sayonara Peixoto.

A gestora destaca ainda a oferta de merenda e a flexibilidade do horário que colaboram com a perseverança dos alunos em sala de aula. “São pessoas que passam o dia trabalhando e que, muitas vezes, não têm condições de ter uma alimentação adequada ou nem mesmo dá tempo de jantar antes de ir à escola. E aqui eles gostam muito do cardápio com sopa, cuscuz e macaxeira. Assim, eles ficam concentrados nas aulas e aprendem mais”, comentou Sayonara.

A interação entre professor e aluno segue uma dinâmica de ensino de acordo com o ritmo de aprendizagem. Joelma Ferreira leciona há cinco anos nesta modalidade e reconhece que as aulas se tornam também um aprendizado para quem acompanha o desenvolvimento dos alunos. “É uma troca de experiência formidável, porque eles aprendem comigo e também vou aprendendo com eles. É um exercício diário muito enriquecedor”, disse a educadora.

Metodologia de ensino acompanha ritmo de aprendizagem dos alunos Ejai
(Foto: Pei Fon/ Secom Maceió)

A aluna Edilma dos Santos, de 54 anos, confirma a boa metodologia em sala de aula. “A professora Joelma é muito dedicada e tem muita paciência”, relatou.

Com um perfil diferenciado do ensino regular, as turmas da Ejai recebem uma atenção especial. Atividades físicas, visitas a museus e teatros, eventos literários, cidades históricas e até pequenos cursos de culinária melhoram o autoestima dos estudantes e estimulam o interesse pelos estudos.

Mapa das 52 escolas municipais que ofertam modalidade Ejai

“Temos, por exemplo, o projeto Ateliê dos Sentidos com apresentações de teatro, que dá a oportunidade aos estudantes de descobrirem o próprio ‘eu’ em suas potencialidades e nas inter-relações com os demais”, enfatiza Rubens Lima, coordenador da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (Ejai) em Maceió. “Então esse movimento de alfabetização visa despertar nas pessoas o interesse de voltar a estudar, porque o processo de escolarização está mais próximo da realidade delas”, acrescentou.

Rubens é coordenador da Ejai na Rede Municipal
(Foto: Pei Fon / Secom Maceió)

Oficinas

Há também alunos colocando a mão na massa. Oficinas de culinária são outras iniciativas que as escolas adotam com os alunos da Ejai. Na Escola Municipal Dom Hélder Câmara, localizada no bairro do Feitosa, as atividades do projeto “Faça você mesmo” propõem a confecção de bolos e salgados, incentivando as descobertas de habilidades e o espírito empreendedor.

“São projetos de realização pessoal, que promovem a geração de renda e que extrapolam a escolarização e levam o mundo do trabalho para a sala de aula”, colocou Lima.

Alunas produzem e aprendem sobre empreendedorismo
(Foto: Ascom Semed)

A Coordenação da Educação de Jovens, Adultos e Idosos também lembra que a Secretaria Municipal de Educação (Semed) prioriza as vagas para a modalidade em escolas da periferia. Já está em planejamento o projeto “Ejai nas Grotas”, com o objetivo de levar a alfabetização em localidades de difícil acesso em parceria com igrejas e associações que vão funcionar como uma extensão das escolas.

Pnud (ONU)

Com a pretensão de erradicar o analfabetismo na capital até 2024 ou reduzir a pelo menos 4%, em números absolutos os índices da população analfabeta com mais de 15 anos, a Prefeitura de Maceió, por meio da Secretaria Municipal de Educação, tem investido na Ejai com a formação de professores, projetos culturais, merenda com um cardápio variado e ações com parceiros.

Educação física melhora o autoestima e o desempenho dos estudantes
em sala de aula (Foto: Pei Fon / Secom Maceió)

Desde 2013, as ações têm recebido a colaboração do Pnud, que realizou um trabalho de pesquisas, levantamento de dados e uma avaliação da Rede Municipal. A partir do estudo e de novas diretrizes, a Semed vem mantendo a parceria, dialogando e levando melhorias para a educação pública.

Rita Ippolito, coordenadora geral do projeto da ONU em Maceió, reconhece os desafios da educação na capital, os resultados positivos da parceria e o comprometimento da Rede. “A Ejai se insere em um contexto local cheio de desafios derivados da violência e da pobreza. E nossos trabalhos não se resumem em identificar problemas, mas também ir mais a fundo e dar visibilidade a soluções inovadoras”, explicou. “Estamos muito orgulhosos e contentes de poder acompanhar essa aventura pedagógica da Semed, uma rede muito comprometida com o desenvolvimento da educação”, frisou.

Rita Ippólito coordena projeto da ONU em Maceió
(Foto: Marco Antônio / Secom Maceió)

Fruto de uma parceria entre a Semed, a ONU e a Universidade Federal de Alagoas, foi publicado o livro “Orientações Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos”, com diretrizes pedagógicas para os professores da Rede Municipal de Ensino que atuam na modalidade Ejai.

Ouça a reportagem abaixo e saiba mais sobre a construção do conteúdo, o trabalho desenvolvido pelo Pnud e a importância da Educação de Jovens, Adultos e Idosos.